Ela previu o colapso do Brasil. Agora, é a favorita (por uma margem estreita) para 2018. Será que chegou a sua vez?
DADO GALDIERI/BLOOMBERG/GETTY
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Houve um breve momento durante a campanha presidencial brasileira em 2014 em que Marina Silva parecia destinada a ganhar tudo. Ao escapar notoriamente da pobreza, da malária, intoxicação por mercúrio e outros horrores aos que se expôs crescendo na Amazônia, aprender a ler aos 16 anos, e transformar-se de empregada doméstica em uma ambientalista de renome mundial, ela parecia uma figura ideal para levar adiante o progresso social do Brasil e, ao mesmo tempo, colocar um fim à podridão cada vez mais evidente que ruía o governo da então presidente Dilma Rousseff.
Apenas cinco semanas antes da eleição, as pesquisas mostravam Marina, como os brasileiros a chamam, com uma vantagem de 10 pontos em um segundo turno hipotético contra Rousseff. Mas então a titular do cargo disparou uma enxurrada de ataques, incluindo um comercial de TV memorável em que apoiadores ricos fictícios de Marina riam enquanto a comida desaparecia das mesas da classe trabalhadora. Ainda mais prejudicial, os seguidores de Rousseff acusaram Marina de querer cortar programas sociais, incluindo o Bolsa Família, que paga um salário para cerca de um quarto da população brasileira, a fim de reestabelecer o equilíbrio orçamental.
Nesse tempo todo, os assessores de Marina pediam que ela aliviasse sua mensagem, parasse de falar sobre a recessão, a corrupção e catástrofes iminentes. Mas ela não lhes deu ouvidos. “Nós apresentamos um programa dizendo que o Brasil estava à beira de uma crise económica”, recorda Marina em uma entrevista com a AQ. “Quando eu disse que eu não ia dizer que as coisas iam continuar do mesmo jeito ou melhor, certo, algumas pessoas ficaram muito chateadas. Mas eu disse, ‘Eu não posso ganhar eleição com uma mentira.’ Porque logo em seguida tudo isso vai desmorunar e a sociedade não vai nós perdonar.”
Marina pagou o preço: O apoio popular nas pesquisas despencou, e ela terminou em terceiro lugar no dia da eleição, com apenas 21 por cento dos votos, ficando completamente fora do segundo turno. Mas em poucas semanas, infelizmente, tornou-se óbvio o quão presciente ela era. O Brasil acabou registrando a pior recessão de sua história e, apenas três meses após Rousseff ter iniciado seu segundo mandato, dois terços dos brasileiros diziam que queriam seu impeachment. E eles finalmente o conseguiram, em agosto de 2016. Mas a crise ainda não foi controlada sob a liderança do sucessor de Rousseff e seu vice-presidente, Michel Temer, com o desemprego subindo para 11 por cento, novas revelações de corrupção surgindo, e pouca esperança de um retorno iminente do Brasil aos dias de glória.
Hoje, a maioria dos brasileiros se arrepende de seu voto - e eles ainda podem ter uma chance de corrigir o erro. As pesquisas sugerem que Marina é a personagem política proeminente mais popular do país e a favorita, por uma margem estreita, para a próxima eleição presidencial em 2018. Com uma reputação de integridade, uma agenda econômica centrista e a virada ocorrida após sua candidatura fracassada, a vez de Marina pode estar chegando. Ela não confirma que participará da disputa, mas certamente fala como se fosse. “Nesse momento o mais importante é resolver a crise política”, diz ela. “A maior parte dos problemas que nós estamos enfrentando hoje no Brasil é em função da crise política ... eu saí batendo muito na tecla de que o Brasil precisava um gente mente fazer avanços políticios, uma reforma politica.”
Pode parecer muito cedo para pensar em 2018; afinal, o Brasil não acabou de ganhar um novo presidente? Mas os defensores do próprio presidente Temer tendem a concordar que ele é uma figura de transição, devido ao mandato abreviado e a controvérsia em torno do impeachment de Dilma. O trabalho pesado necessário para consertar o Brasil - reformas difíceis e polêmicas, como a simplificação do código fiscal, uma revisão das leis de financiamento de campanhas, e uma abertura ao comércio exterior - vai requerer um líder forte, com um mandato popular, inquestionável. Então, de São Paulo à Amazônia, Wall Street e além, qualquer um com planos de fazer uma aposta de longo prazo no Brasil já está olhando para frente.
Essa é uma tarefa difícil - a vitória de Marina não é certeira. A próxima eleição parece a mais imprevisível desde que a democracia plena foi restabelecida no Brasil em 1989. A disputa pode contar com uma dúzia de candidatos, cada um com seus próprios grupos fragmentados. Ao mesmo tempo, Marina tem suas próprias falhas para corrigir. Porque a dura verdade é que, em 2014, não foram apenas os anúncios negativos que a tiraram da corrida. Havia outros fatores, mais pessoais, também em operação.
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Alguns se esqueceram disso, mas Marina nem deveria concorrer à presidência em 2014.
Ela rejeitou uma oportunidade para ser a candidata de um partido pequeno, aceitando, em vez disso, um convite de Eduardo Campos, governador carismático, para ser sua companheira de chapa. A decisão causou surpresa, já que Marina havia conseguido chegar com força como terceira colocada na eleição presidencial de 2010, e tinha mais reconhecimento de nome naquele momento que Campos. A percepção em Brasília, que ecoava na época entre alguns dos próprios aliados de Marina, era que ela se sentia mais à vontade em um papel figurativo no qual pudesse defender um ou dois tópicos próximos a ela, como o meio ambiente, e deixar o dia a dia do governo para outra pessoa.
Campos morreu em um acidente de avião dois meses antes da eleição, abruptamente levando o nome de Marina para o alto da cédula eleitoral. Mas, mesmo assim, as dúvidas nunca cessaram. A história de vida de Marina fez dela uma voz moral necessária e inspiradora, argumentavam muitos, mas nem todo mundo tem as habilidades necessárias para ser presidente de um país tão grande e tão propenso a crises como o Brasil.
Alguns defensores de Marina dizem que esse ponto de vista é sexista, enquanto outros veem uma estirpe particularmente brasileira de classismo - uma crença de que ninguém com essas raízes humildes teria como enfrentar um trabalho tão grande. Marina, por sua vez, reconhece que sua figura física relativamente frágil - que é produto de sua formação - pode ser a verdadeira fonte das dúvidas sobre sua adequação para o cargo.
“Olha”, diz ela com um sorriso: “Acho que as pessoas muitas vezes vêem até o meu biótipo, o meu histórico de vida, uma pessoa que teve cinco malárias, três hepatites. Eu tenho uma saúde muito boa, graças à deus. Mas eu não acredito na política como esses estereótipos que as pessoas têm, de que você tem que mostrar que é um superpolítico, um superherói ... eu não disputo na frequência da polítca tradicional e acho que esse é um momento que a gente precisa talvez muito mais de força interior do que força física.”
Marina também é assombrada por sua associação até 2009 com o Partido dos Trabalhadores, o partido da Rousseff e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está agora no centro de várias investigações de corrupção. Marina não só foi ministra do Meio Ambiente de Lula, mas também sua amiga, e fotos íntimas dos dois se espalham pela internet. Buscando separar-se de seu passado, Marina preferiu fazer campanha em 2014 como uma candidata de centro-direita em questões econômicas, apoiando a independência do banco central do país, por exemplo. Isso alienou alguns de seus seguidores antigos, o que a forçou a ir atrás de uma nova base que não era leal a ela - e rapidamente a abandonou quando começaram os ataques de Dilma.
Isso tudo levanta a questão: Será que Marina pode representar uma pausa suficiente dos políticos tradicionais para ter sucesso em 2018? Especialmente se essa se tornar uma eleição de expurgo, como prevê a maioria?
No dia da nossa entrevista, jornais locais publicaram novas alegações de que sua campanha de 2010 havia sido financiada com dinheiro sujo. Enquanto conversávamos à margem de uma conferência em São Paulo, uma horda de repórteres a esperava do lado de fora para interrogá-la. “Eles estão tentando me destruir”, sussurrou Marina, em uma aparente referência à elite política brasileira, “porque eles veem que eu sou a única que nunca se envolveu”. As acusações sobre as finanças da campanha nunca foram totalmente justificadas, e Marina as negou. Mas sua reação pode prenunciar outros desafios que terá pela frente.
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Se ela conseguir superar esses obstáculos, o apelo de Marina - aos eleitores e investidores - é claro. Ela tem uma visão convincente de que o Brasil deu errado, colocando o foco não apenas na corrupção, mas também nas políticas econômicas fracassadas da década passada. A maioria dos observadores acredita agora que o Partido dos Trabalhadores confiou demais em estimular a demanda doméstica, negligenciando áreas como escolas e infraestrutura. “Não podemos dizer que uma clase se forma em função do consumo que essa clase tem”, diz Marina. “(Em vez disso), é pelos bens e serviços que essa clase passa a ter aceso, pelo nivel de educação que essa clase passa a ter aceso, até porque se ela for apenas em função do consumo, logo ela vai desaparecer.”
Marina também tem dado apoio incondicional à operação Lava Jato, que investiga a corrupção na Petrobras e muitos brasileiros veem como o único aspecto positivo dos últimos dois anos de crise. “O Brasil tem a chance de ser passado a limpo para melhorar a qualidade das instituações. O Brasil é um país que infelizmente ainda não aprendeu a institucionalizar suas conquistas”, diz ela.
Com uma forte equipe de consultores que inclui Neca Setubal, célebre especialista em educação e membro de uma família de banqueiros destacados, os temores de que Marina poderia levar a economia em uma direção mais radical se for eleita, também diminuíram. Declarações que soavam fora da realidade quando o Brasil ainda estava crescendo parecem visionárias no contexto mais humilde e mais conturbado de hoje.
“O Brasil tem grande possibilidade de mudar o seu modelo de desenvolvimento do modelo insustentável para o modelo sustentável”, diz ela. “Mas isso so será possível se for capaz de ter lideranças políticas que estejam comprometidos não em fazer mais do mesmo.”
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Brian Winter é o editor-chefe da Americas Quarterly.
Any opinions expressed in this piece do not necessarily reflect those of Americas Quarterly or its publishers.
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